A Universidade de Brasília (UnB) aprovou, nesta quinta-feira (17), uma resolução histórica que implementa cotas para pessoas trans em mais de 130 cursos de graduação. A decisão, tomada por unanimidade pelo Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (Cepe), reserva 2% das vagas para candidatos autodeclarados trans, abrangendo travestis, mulheres trans, homens trans, transmasculinos e pessoas não-binárias. As cotas se aplicam a todas as modalidades de ingresso na instituição.
“Este é um marco histórico para a UnB e para o Distrito Federal. Nossa universidade, que foi pioneira na implementação de cotas para pessoas negras em 2003, e nas cotas étnico-raciais na pós-graduação em 2020, avança agora com as cotas para pessoas trans na graduação”, destacou o vice-reitor Enrique Huelva, que presidiu a reunião de aprovação da medida.
As cotas trans devem ser implementadas já no vestibular de agosto de 2025, com ingresso previsto para o primeiro semestre de 2026. Outras formas de ingresso, como a seleção via Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), também incluirão a nova política de ação afirmativa.
“O candidato que optar por concorrer por cotas só ocupará a vaga destinada a essa ação afirmativa se não alcançar a classificação pela ampla concorrência. Caso as vagas de ação afirmativa não sejam preenchidas por pessoas trans, elas serão redirecionadas para a ampla concorrência”, explicou o decano de Ensino de Graduação da UnB, Diêgo Madureira.
Desafios da população trans
Dados da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra) e outras organizações indicam que apenas 0,3% das pessoas trans no Brasil conseguem acessar o ensino superior. Um relatório técnico da Antra, publicado em setembro de 2024, revela que menos de 30% da população trans no país conclui o ensino médio, e cerca de 90% recorre à prostituição como fonte de renda.
Lucci Laporta, assistente social e militante transfeminista, formada pela UnB, relatou os desafios enfrentados durante sua graduação. “Era um sentimento de solidão, de ser a única em quase todos os espaços. Meu nome social não era respeitado, e eu tinha que explicar a cada professor que o nome no sistema era outro. Fui ameaçada de violência e tinha medo de andar sozinha pela universidade”, contou.
Agora, Lucci vê a implementação das cotas como um avanço crucial. “Precisamos continuar a luta por um ambiente transinclusivo. Com mais estudantes trans, teremos mais força para transformar a universidade.”
Inclusão e permanência
O vice-reitor Enrique Huelva afirmou que a UnB está preparada para receber esses novos alunos e oferecerá mecanismos de suporte para garantir sua permanência. “Nosso objetivo é proporcionar um ambiente em que essas pessoas possam se desenvolver sem precisar alterar suas identidades ou subjetividades. Estamos prontos para aprender com essa comunidade.”
Próximos passos
Com a nova resolução, o Comitê Permanente de Acompanhamento das Políticas de Ação Afirmativa (Copeaa) da UnB será responsável por estabelecer os procedimentos para a heteroidentificação dos candidatos trans, semelhante ao que já ocorre com os autodeclarados pretos, pardos e indígenas.
A UnB agora se junta a outras universidades federais que adotaram cotas para pessoas trans, como a Universidade Federal do ABC (UFABC), a Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB), a Universidade Federal da Bahia (UFBA) e a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
Desde 2017, a UnB assegura o uso do nome social para pessoas trans e travestis, e, em 2021, a universidade também reservou 2% das vagas de estágio para esse público. Além disso, já há cotas para pessoas trans e travestis em programas de pós-graduação em unidades como Direito, Comunicação, Economia, Administração, Contabilidade, Gestão Pública, Artes e Psicologia.
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